sábado, 22 de agosto de 2009

AGRURAS

(27/07/09)
A situação de desempregado não é confortável e nem poderia ser, mas podemos tirar proveito dela para refletir sobre a nossa sociedade e comportamento, como qualquer outro fato que vivenciamos em nossas vidas.

Recentemente, uma amiga foi tomada de surpresa. Ao comparecer na reunião semanal que a empresa realizava com periodicidade e que envolvia todo o quadro de funcionários, deparou-se apenas com o seu contratante. Os outros, presumiu, tinham sido avisados do cancelamento da reunião. Da surpresa inicial passou-se a uma série de “surpresas”. Junto com a demissão veio a reboque as justificativas e argumentos que lhe parecia incabíveis. “Não se preocupe, você terá todos os seus direitos”... Ora?! Se é direito seu, logo um dever do empregador e, portanto, desnecessário a cautela para não se preocupar. O empregador não está lhe fazendo nenhum favor. Em seguida veio a pérola: “Você já tem alguma coisa em vista?”.


PREVENÇÃO
Nesse nosso mundo, temos que estar sempre prevenidos. Exceto os funcionários públicos, todos os outros estamos à mercê da demissão e com ela o aviso prévio, fundo de garantia, féria proporcional, seguro-desemprego etc.

Não me dou ao luxo de escrever que nunca estive nessa situação, mas raro foi recorrer ao seguro desemprego. Dessa última vez, foi necessário, pois as perspectivas não eram de emprego, mas de trabalhos (jobs).

A princípio, parece assustador ter que ir a uma unidade do Ministério do Trabalho retirar o tal seguro. Imagina-se uma fila enorme. Sim. Mas é tudo uma questão de comunicação. Não é à toa que brasileiro gosta de uma fila, mas deveria se valer da fama de bom de papo. Na minha primeira tentativa cheguei às 10h, não tinha mais senha, uma fila com umas 20 pessoas e gente reclamando que estava lá desde às 7h, sendo que as 50 senhas eram distribuídas a partir das 9h.

Na segunda tentativa, fui mais cedo peguei a minha senha e me informei. Não precisava ficar ali aguardando, podia voltar mais tarde que seria atendido mesmo que o número da senha tivesse passado. Foi o que fiz, e na volta fui atendido na mesma hora que cheguei – já não havia mais ninguém – em apenas 10 minutos.

Passados 45 dias, depois de dar entrada com toda a papelada na Caixa Econômica, você passa a receber de R$ 465,00 até R$ 870, 01, durante 3 ou até 6 meses. As retiradas podem ser feitas em caixas lotéricas, caixas eletrônicos e nas próprias caixas do banco. Simples assim? Nem tanto. A Caixa Econômica da preferência que você retire nos caixas eletrônicos do que eu seus próprios caixas, ou nas lotéricas. Mas os caixas eletrônicos não dão moedas e nem sempre as caixas lotéricas tem dinheiro em caixa. Aí, se estabelece uma via-crucis. Agora, porque o valor tem que ter centavos? 1 centavo fez toda a diferença.


MEU CARO AMIGO
“Meu caro amigo me perdoe, por favor

Se eu não lhe faço uma visita
Mas como agora apareceu um portador
Mando notícias nessa fita
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol

Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta...”


CULPA E VERGONHA
Normalmente os desempregados são tomados por culpa e vergonha diante de sua situação. O que não minimiza em nada o problema. Essa vergonha ainda é maior quando o desempregado tem escolaridade e qualificação acima da média. Quem diz isso não sou eu, mas a doutora em ciências socias, Marineide Maria Silva, que defendeu a tese “Mosaico do Desemprego”, no último dia 9 de junho, na Unicamp.

Segundo ela, o desempregado, nessa situação, contava com um suporte financeiro maior e tem quebrada a sua trajetória de vida. Como manter, agora, um padrão de vida que gozava? Para esse, o desemprego é mais sofrido. Ele sente-se culpado e envergonhado.

Há uma diferença entre vergonha e culpa. A vergonha é uma resposta à avaliação dos outros, portanto externa, a culpa é uma avaliação interna e que privilegia uma autonomia individual. A culpa não precisa de audiência, de público; a vergonha ocorre mediante a desaprovação ou o deboche de outros.


SOCIEDADE SEM-VERGONHA
Ruth Benedict, antropóloga americana, desenvolveu um estudo muito importante sobre esse assunto e que está publicado no seu livro “O Crisântemo e a Espada", de 1946. Ela chegou a conclusão que nas sociedades orientais, como a japonesa por exemplo, o comportamento moral baseia-se na vergonha e nas sociedades ocidentais, como a americana, baseia-se na culpa. Mas em ambas os dois afetos estão presentes, apenas um dominante sobre o outro.A vergonha é um regulador moral para as sociedades tradicionais, em que, além das leis, e acima delas, existem os códigos de honra e um legado dos ancestrais. Já nas sociedades individualistas modernas, é a culpa que se estabelece como o regulador, onde caberá a um Deus nos julgar, condenando-nos ou não.

Em nossa sociedade, de base católica, podemos fazer as coisas erradas, nos sentirmos culpados e pedirmos desculpas, pois existe o arrependimento e a penitência como condição da confissão. E, assim, nos sentimos culpados e sofremos com essa culpa, mas com a promessa do perdão que anularia a própria culpa. A culpa é como se fosse um pagamento antecipado.
A vergonha é um regulador moral muito mais eficaz que a culpa, pois a própria culpa absolve o sujeito culpado, a vergonha mancha, e sentir vergonha não restitui a dignidade de ninguém. A única cura da vergonha está nos atos futuros do sujeito.

Mas, como muito bem observou o psicanalista e psicoterapeuta Contardo Calligaris, no Brasil, a sabedoria da língua nos sugere algo diferente da proposta defendida por Benedict, que seria a nossa ação moral regulada pela culpa. Ao empregarmos um “não tem vergonha na cara” ou um “sem vergonha” ao malandro, estamos tornando essa forma corriqueira em adjetivo, assim como “pouca-vergonha” vira substantivo. Então, pela língua, a nossa moral espera mais da vergonha do que da culpa.

Deve ser por isso que os nossos políticos nunca dizem que estão envergonhados. Na hora das justificativas, o apelo se da pela culpa...” A culpa não é minha. A culpa é do Senado”
”Mas como funciona (ou não funciona), então, a vergonha numa sociedade moderna, como a nossa?”, pergunta o psicanalista.


MEU CARO AMIGO
“Muita mutreta pra levar a situação

Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando e também sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu não pretendo provocarNem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades

Aqui na terra tão jogando futebol

Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol

Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta ...”


FACE ROMÂNTICA
Mas há o lado poético e romântico dessa situação de penúria que passa o desempregado. Não é só drama. Quem, nessa situação, não já ouviu: “quando uma porta fecha, outra se abre...”? Ou as variações sobre o mesmo tema?

É muito comum, também, escutarmos as histórias dos desempregados que montaram o seu próprio negócio e se tornaram grandes empresários. É a tal história “depois da tempestade vem a bonança”.

Um bom exemplo é a autora da série best seller “Harry Porter”. A escritora inglesa, Joanne Kathleen Rowling – que na próxima sexta-feira completa 46 anos – ao ficar desempregada começou a escrever a história do pequeno bruxo que seria um grande sucesso nas livrarias e mais tarde nos cinemas. No rastro dessa trajetória viriam mundos de dinheiro e prestígio – e atrás disso, poder.

Mas a história é um pouquinho diferente. Em 1991, após a morte da mãe, ela abandonou a carreira administrativa, demitindo-se do cargo que exercia na Anistia Internacional em Londres, e foi para o Porto (Portugal).

Em Portugal, dava aulas de inglês pela manhã e a tarde, nos cafés, escrevia o livro que se tornaria o primeiro volume da série: “Harry Potter and The Philosopher's Stone”. Casou-se com um jornalista português, tiveram uma filha e se separaram. E após várias tentativas de publicar o livro, sendo rejeitada por várias editoras, recebeu uma proposta em 1996 da Bloomsbury, e aceitou.

Desde, então, são 6 títulos da série que já foram adaptadas para o cinema, sendo a mais recente “Harry Potter e o enigma do príncipe ” e o sétimo livro já publicado, “Harry Potter and the Deathly Hallows.” O resto todos nós sabemos.



MEU CARO AMIGO
“É pirueta pra cavar o ganha-pão

Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro
Ninguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa

Aqui na terra tão jogando futebol

Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol

Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta ...”


VALE O QUÊ?
Semana passada, o Presidente Lula, acompanhado pelos Ministros da Cultura, Juca Ferreira, e da Casa Civil, Dilma Roussef, lançaram o Vale Cultura. A proposta é democratizar a cultura e dar acesso aos trabalhadores com carteira assinada. Ficam de fora aqueles trabalhadores informais e os empregados sem carteira assinada. Já na sua origem, o vale não alcança a totalidade de trabalhadores. O programa não é obrigatório, a Empresa poderá optar em utilizá-lo ou não. Mas o que vem a ser esse vale?

Ele tem a estrutura, mais ou menos, do o vale transporte e do tíquete refeição, mas ainda não sei exatamente como funciona. Sei que o trabalhador receberá um cartão magnético com saldo de até R$50 por mês para a compra de livros, Cds, DVDs, ingressos para cinemas, teatros, museus, shows e demais produtos culturais. E o desconto na folha do funcionário será relativo ao seu salário. Os trabalhadores que ganham até cinco salários mínimos arcarão com, no máximo, 10% do valor (R$ 5). Os que ganham mais de cinco salários mínimos também poderão receber o benefício, desde que antes a empresa garanta que os funcionários com renda inferior sejam beneficiados. Para os que recebem mais de cinco salários, o desconto poderá variar de 20% a 90%.

A proposta teria a intenção de corrigir as carências apontadas pela pesquisa do IBGE, com dados de 2006, que demonstrou que apenas 14% da população brasileira vai mensalmente aos cinemas, 96% não frequenta museus, 93% nunca foi a uma exposição de arte e 78% nunca assistiu a um espetáculo de dança. Isso sem falar na sempre proclamada concentração de opções e recursos para cultura na região sudeste, principalmente no Rio de Janeiro e São Paulo.
O projeto foi encaminhado para a Câmara dos Deputados em caráter de urgência para que seja aprovado e siga para o Senado em busca de uma aprovação em tempo recorde. Com isso o Ministério da Cultura inverte a lógica das políticas anteriores e passa a estimular o consumo de bens culturais, em vez de financiamentos da cultura.


INDELICADEZA
Nessa mesma ocasião, o presidente lembrou que junto com o vale cultura estava indo para o Congresso a reforma da Lei Rouanet. Outra discussão que não acaba. Mas, ao falar das distorções da Lei, o Presidente fez críticas ao Instituto Itaú Cultural, causando constrangimento a alguns convidados, como por exemplo, Milu Villela, acionista e braço direito do Banco Itaú. O Presidente fez críticas que o Banco não utilizaria “dinheiro bom” (assim conhecido os investimentos oriundos sem isenção fiscal) em seus projetos culturais.

Eu fico impressionado como esse governo não incentiva e elogia a qualidade dos projetos realizados pelo Itaú Cultural, Bradesco e Fundação Roberto Marinho, por exemplo. Qual seria a diferença entre essas instituições e empresas, no âmbito de patrocinadores, e a Petrobras, por exemplo? A Lei é para todos e os projetos inscritos nela não recebem dinheiro, eles, quando aprovados pelo Ministério, estão aptos a captar. E a escolha deve ser da empresa. Parece que é desmérito ter dinheiro e por isso não usufruir das leis que são para todos sem distinção.


MEU CARO AMIGO
“Muita careta pra engolir a transação

E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinhoNinguém segura esse rojão
Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se me permitem, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas nesse disco
Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol

Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta...”



MEU PAI SENADOR, O CHALAÇA
Pero Vaz de Caminha, depois de comunicar a chegada à nova Terra de Vera Cruz, já teria pedido ao Rei uma ajudinha, o retorno a Portugal de seu genro, que, depois de ter roubado uma igreja e espancado o padre, havia sido degredado para São Tomé (África).

Dom Pedro I tinha como companheiro o português Francisco Gomes da Silva, o Chalaça, especialista em conseguir cargos no governo para os amigos. E desde então os escândalos, sexuais, financeiros, políticos, foram se sucedendo.

Meu pai queria que eu fosse jogador de futebol ou militar, minha mãe queria que eu fosse médico, eu escolhi ser designer... e o continuar dessa história vocês já sabem.

Mas fico aqui pensando, bem que meu pai poderia ter sido Senador. Será que eu gostaria de ter o meu pai como Senador da República? Por que ele não foi ser senador? Assim hoje poderia estar com um emprego no Senado, fazer parte do clube do namorado da neta do Sarney, e dizer: “É um privilégio para o Senado ter um funcionário como eu”.

Será?

“Pois uma coisa é você matar, outra coisa é você roubar, outra coisa é você pedir um emprego, outra coisa é relação de influências, outra coisa é o lobby... e você não pode vender tudo como um crime de pena de morte.” Mas se for tudo junto, não piora? Ainda bem que não tem pena de morte em nosso país.




MEU CARO AMIGO

“A Marieta manda um beijo para os seus
Um beijo na família, na Cecília e nas crianças
O Francis aproveita pra também mandar lembranças
A todo o pessoal
Adeus”

Nenhum comentário: