terça-feira, 2 de março de 2010

MUNDO ENCANTADO




BOA NOITE CINDERELA HOSPITALAR
“Boa noite, Cinderela, ...” era com essa música que um quadro do programa do Silvio Santos abria no início das noites de domingo. Um quadro ingênuo, onde as meninas realizavam os seus sonhos encantados.

Hoje, o boa noite Cinderela é o mais conhecido golpe aplicado nas baladas aos descuidados e tolinhos de plantão. Coloca-se um sonífero qualquer na bebida do sujeito e boom! Na noite seguinte, o cara aparece desprovido de qualquer documento ou dinheiro, isso na melhor das hipóteses. Às vezes ele acorda em sua própria casa vazia.

Mas não precisa ser tão tolinho ou ingênuo assim, e muito menos sofrer o golpe nas madrugadas em alguma balada (como gostam de dizer). O golpe tem se mostrado tão eficiente, que já estão aparecendo no mercado novas adaptações e muito mais eficientes.

Eu mesmo acabo de sofrer com uma dessas adaptações: “boa-noite-cinderela-hospitalar”. Basta ter uma pedrinha no rim ou na vesícula, e pronto. Você se torna um candidato a sofrer o golpe. Foi assim comigo.

No final do ano, descobri que tinha algumas minas de cálcio no rim, bexiga e vesícula. O médico – indicação de um grande amigo meu – disse que tinha que operar e que o valor da anestesia era tabelado, portanto não precisava me preocupar. Ok! Eu, como bom moço, a princípio, tenho a tendência de acreditar em todos.

Sabia que o meu plano de saúde – assim como nenhum outro – cobria todo o valor da anestesia, mas não imaginava que poderia ser tão pouco. Conclusão: a anestesista, mãe do médico, no dia 4, pediu que eu respirasse uma... duas... três e zump! Como num passe de mágica de Paulo Barros, 2 mil reais sumiram da minha conta bancária.

Mas fiquei com um brinde: um cateter, o famoso duplo J, dentro de mim para ser retirado ainda esse mês. Mais uma vez, vou contar um... dois... três e zump! Menos 2 mil reais na minha conta sumirão num passe de mágica.

Agora, como tenho o ureter estreito – nunca tenham o ureter estreito, é uma merda – vou ter que passar por nova incursão cirúrgica e depois de restabelecido, será a vez e hora da incisão na vesícula.

Vão contando aí... um... dois... três e zump!


PRIMO POBRE E PRIMO RICO
Essa história fez-me lembrar uma das histórias do primo pobre e primo rico do Brandão Filho e Paulo Gracindo, em que o primo pobre, como sempre, vai pedir dinheiro para o primo rico para resolver um problema da mulher.

A desculpa do primo rico era sempre a mesma: comparava o problema do primo com o seu próprio problema em escalas bem diferentes.

Dessa vez a mulher do primo pobre estava com uma pedra na vesícula e tinha que retirar, mas ele não tinha dinheiro. Estão acompanhando? Como os problemas da mulher do primo pobre eram sempre muito parecidos com os do primo rico, dessa vez o problema da classe mais abastada era retirar da alfândega uma pedra preciosa vinda da Bélgica.


BRANCA REGINA NEVE
Continuando na linha do Mundo Encantado, tem uma passagem na animação da “Branca de Neve e os 7anões” em que ela procurando um lugar para passar a noite, depois de fugir pela floresta, encontra a casa dos pequenos futuros amigos. Ao entrar, depara-se com uma casa pequena, empoeirada, com muita louça para lavar e com móveis, proporcionalmente, pequenos. E conclui: tratar-se de uma casa de pequenos órfãos. Isso me soou familiar.

Sábado passado, finalmente, a Dona Regina – filha da falecida proprietária do apartamento que alugo – veio conhecer um dos cinco apartamentos do prédio que agora lhe pertencem: o que moro. Desde que a falecida bateu as botas, ela vem tentado marcar um dia para uma visita. Mas como eu só posso aos sábados, e aos sábados ela não pode, não havia combinação. Mas no sábado passado, ela não viajou e não escapei.

Muito educada, ligou e perguntou se podia me visitar. Não tinha como negar. Ela disse que tinha acabado de sair de uma aula de yoga, tomaria um banho e viria. Pediu para colocar o carro na minha vaga e perguntou por onde deveria entrar. Expliquei, e ela me passou as características do carro. Um Kia preto.

Estava preocupado com a visita por causa das portas dilaceradas pelo Joachim. Por estratégia, deixei a porta da sala aberta para recebê-la, e a pequena confusão de segurar o Joachim fez perder um pouco a atenção naquilo que não queria que ela percebesse.

Trajando um vestido de verão branco e óculos de cobrir metade do rosto, chegou com um sorriso acolhedor. Cabelos castanhos soltos, exalava um aroma e frescor de quem, realmente, acabara de tomar um banho. Um homem jovial, apesar de aparentar a melhor idade, a acompanhava. Pelo seu traje – camisa pólo e jeans – percebia-se tratar de um executivo em fato de final de semana. Apressei-me em avisar que tinha um cachorro e que ele pulava. Ela mais do que depressa se afastou, na intenção de proteger o vestido branco incólume.

Educada, foi percorrendo o apartamento, e eu atrás fazendo os comentários dos prós e contras do seu bem. Não sei se agi certo. Os comentários dela mostravam a total inabilidade com um apartamento no bairro de botafogo. “Ah! Você tem ar condicionado?! Ponto para internet e tv a cabo!” “Na cozinha cabe uma geladeira, muito bom”. “Cabe, também, uma máquina de lavar, maravilha.” “O chuveiro do quarto de empregada funciona?”. “Sol da tarde ou da manhã?”. Concluiu: “Um bom apartamento”. Fico imaginando o que será que ela esperava encontrar.

Sabia tudo de mim, mas eu, nada dela. Mas logo fui tratando de retirar a chancela que me apresentaram: “você trabalha na Petrobras”. “Não, hoje, trabalho na Secretaria de Cultura” – respondi. O homem de final de semana perguntou: “ do estado?”. Respondi que sim. Não sei se isso era bom ou ruim.
http://www.youtube.com/watch?v=nN1BegE3QR0


ACORDA ALICE
Em breve, nos nossos cinemas, Tim Burton nos saldará com uma bela obra cinematográfica. Será mais uma adaptação vinda da literatura, dessa vez “Alice no país das maravilhas”, de Lewis Carroll. Uma das obras inglesas mais adaptadas para o cinema, TV e teatro.

É uma história fantasiosa de uma menina que por um descuido cai na toca do coelho que dá passagem para um mundo extraordinário, cheio de personagens loucos e, por vezes, maquiavélicos. É uma história que evoca a transição, a passagem de um lugar – ou estado –, para o outro.

Não estou em condições de transformações corpóreas, já cresci o suficiente na vertical e não pretendo crescer na horizontal, mas mudanças são sempre inesperadas, para mim. Mas vejo que isso será inevitável. Tenho que acordar desse sonho louco.

http://www.youtube.com/watch?v=1-H5DC9SmOI


AGULHA DA BELA
Ainda me lembro das previsões do astrólogo e radialista, o primeiro esotérico famoso do rádio brasileiro: Omar Cardoso. Em uma das suas previsões ele dava significado para sonhos com agulhas. Agulha em geral é mau sinal.
Agulha de costura > desgosto causado por um ferimento do seu amor próprio
Agulha de tricô > mexerico e intrigas
Enfiar a linha numa agulha > realização de matrimônio
Ver a agulha quebrar-se, partir-se > perda de dinheiro, de emprego ou de situação. Na mulher, pode indicar doença uterina.
Interpretação psicanalítica > agulha é um símbolo sexual


HAPPY END INCOMPLETO
Todos os contos de fadas terminam em “happy end”, mas nesse meu texto será diferente, pela nossa felicidade segundo Jabor, Comte-Sonpoville e Cardoso.

Nessa última terça-feira, li a crônica do Arnaldo Jabor no Jornal O Globo e achei interessante. Um texto sobre felicidade: “Acabou o tempo do ‘happy end’ ”. Seu texto vai ao encontro de um outro texto de um outro autor. Um texto sobre o incompleto, de Mário Esteves Cardoso. Segundo o Mario:

“Nunca vou ao fim das coisas. Tudo começa. Nada acaba. Eu não deixo. No meu sonho, tudo se repete, mesmo que seja preciso interrompê-los de vez em quando. Tenho medo que acabem. Porque é que se hão-de levar as coisas ao fim?

Amo o incompleto, o suspenso, o atravessado, o interrompido. Os fins entristecem-me. Viver as coisas até o fim é matá-las.

E trocá-las por outras novas é traí-las. Melhor trazê-las sempre, duvidosas e imprevisíveis mas ainda gostadas e presentes.”



Jabor chega a uma conclusão, parecida. Segundo ele, não devemos procurar o amor eterno, pois é melhor a vida como grandes aventuras, onde as emoções fortes, as perdas, as lágrimas são sentidas em sua vivacidade e plenamente. Deve-se procurar a “intensidade” em vez da “eternidade”. E, aceitando dessa forma a vida que levamos, a saudade virá “como excitação; a dor com prazer; a parte, como todo; o instante, como eterno.”

“Enquanto sonharmos com a plenitude, seremos infelizes. A felicidade não é sair do mundo, como privilegiados seres, mas entrar em contato com a trágica substância do não sentido. Temos que ser felizes sem esperanças.”


Aí, eu vou buscar outro escritor e filósofo, também, que gosto muito, André Comte-Sponville, que baseado principalmente em Spinoza, escreve:

“ Só esperamos o que somos incapazes de fazer, o que não depende de nós. Quando podemos fazer, não cabe mais esperar, trata-se de querer. É a terceira característica: a esperança é um desejo cuja satisfação não depende de nós. Eu dizia: esperar é desejar sem gozar; esperar é desejar sem saber. Posso acrescentar: esperar é desejar sem poder.

(...) O que é esperança? É um desejo que se refere ao que não temos (uma falta), que ignoramos se foi ou será satisfeito, enfim cuja satisfação não depende de nós: esperar é desejar sem gozar, sem saber, sem poder.”

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