domingo, 27 de maio de 2007

Dê Graças a Teresa

A vida de solteiro, também, tem a sua dose de casado. Não se pode fugir das responsabilidades domésticas, por menor que sejam.

Quem já não teve uma história, ou um problema, para contar sobre essas personagens, atire o primeiro pano de prato. Haja visto o programa de TV, “Diarista”, protagonizado por Claudia Rodrigues como Marinete e muito bem coadjuvado por Dira Paes como Solineuza, ou o longa “Domésticas”, com as personagens: Quitéria (aliás, é a cara da minha primeira diarista), Roxane, Raimunda, Cida e Créo. Eu, por menos ainda, tenho duas pra contar, uma de cada uma. Uma de Graça e outra de Teresa.
Graça vem primeiro. Ela era diarista da minha mãe e foi trabalhar lá em casa. Sempre muito dedicada com o filho da Dona Augusta, fazia o seu serviço de modo simples e humilde, por vezes, quebrando alguma coisa sem me contar, até que um dia, por conta de um problema de saúde, parou de trabalhar.
Nessa época, dividia um apartamento com um amigo. Cada um tinha as suas despesas: supermercado e telefone, fora as contas em comum: aluguel, condomínio, luz e gás. Um dia, esse meu amigo venho contar-me que estava achando estranho a sua conta de telefone, o valor estava alto. Passou um mês, e a conta novamente apresentava um valor alto e com números de celulares desconhecidos. A primeira providência foi colocar um cadeado e depois falar com a Graça.
A Graça – apesar de sermos dois no apartamento – sempre reportava-se a mim. Era eu que a recebia quando chegava pela manhã e que lhe pagava. Talvez, por isso, tinha por mim, consideração extrema. Sempre quando eu ia fazer qualquer reclamação ou observação, fazia sempre com muito cuidado. Mas parece que o cuidado era desnecessário. As diaristas e empregadas domésticas parecem ter uma conduta “muito particular, um mundo próprio, eu diria, onde suas leis, por mais ingênuas e desinteressadas de qualquer vantagem, nos são sempre muito inusitadas.
Bom, nesse dia fui, com muito cuidado, coloquei a situação de forma a não constrangê-la. Mencionei o fato da seguinte maneira: disse-lhe que havíamos observado um aumento na conta telefônica e que achava estranho. Muito tranqüila e resignada, tentando justificar o motivo do uso, explicou a situação de emergência que havia ocorrido. Sua filha estava no hospital e precisava falar com ela ao telefone (uma ligação pelo celular durante meia hora). Mas, imediatamente, de forma a tranqüilizar-me, como se fosse revelar-me um segredo, aproximou-se e disse: “mas fique tranquilo, não usei o seu não, usei o do outro, tá?” Ahh! Tá bom! Como um cão fiel, tentou me poupar, colocando no outro a sua despesa.
Teresa chegou, lá em casa, por indicação de uma amiga pernambucana que trabalha comigo. Nessa época, já tinha me mudado e morava sozinho, agora só na companhia de Joachim. O meu chow-chow. No início, trocava sempre o seu nome, chamava de Graça. Ela não se importava e nem me corrigia.
Começou muito bem, fazendo gelatina sem eu pedir, mas bastou elogiar que na semana seguinte não havia mais gelatina na geladeira. Nunca observei nada quebrado, mas fora de lugar, sim. No dia que ela ia, assim que eu chegava em casa, tinha o trabalho de colocar as coisas no lugar. Não adiantava falar como deveria ser feito, corria o risco das coisas não serem limpas. Fiz uma vez uma observação com relação às roupas que ela passava, pedi que não colocasse mais de uma calça no cabide, pois levava muito tempo procurando. Passaram duas semanas e perdi as calças novamente.
Um dia, reparei que ela substituíra o sabonete no box. Poxa, que capricho – pensei. Não comentei com medo de afugentar o capricho. Na semana seguinte, mais uma vez. O sabonete novinho, fresquinho, virgem. Comecei a pensar que os sabonetes eram vagabundos e que gastavam rápido, ou será que eu tomava muito banho? Na terceira semana, mais uma vez, mas dessa vez, ainda havia um resto de sabonete usado. Achei estranho.
Por fim, na quarta semana, um bilhete explicava tudo. No bilhete estava escrito, entre outras coisas, o seguinte : ‘... estavam faltando 2 embalagens de sabonete para eu conseguir uma sandália na promoção. Com 5 embalagens e mais 10 reais ganho uma sandália. Assinado Teresa”. Custou um pouco para cair a ficha, fui até o banheiro e, no box, ainda o sabonete da semana passada. Aí lembrei de procurar no armário, e encontrei, devidamente empilhadinhos, os dois sabonetes sem embalagens.
Nada é por capricho e tudo tem uma razão de ser.

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